O Direito de Ficar Triste

      



    Você nunca se dá o direito de ficar triste? Talvez você seja uma pessoa que não se permita experimentar essa emoção básica, seja ela desencadeada, por exemplo, por uma crítica infundada de uma pessoa desconhecida. Ou pior, sente-se incomodada se se permitir ficar abatida ainda que por algo intensamente doloroso, como o término de um relacionamento ou demissão. Saiba que se, por um lado, entristecer por tudo sugere algo muito errado conosco, como uma depressão, e nos traz consequências danosas; por outro, a evitação ou negação contínua da tristeza também. Isso nos impede de parar, de aproveitar que o organismo está em stand by, em baixa energia, a fim de que possamos exatamente refletir sobre determinada experiência dolorosa, a fim de obter estratégias de enfrentamento para superá-la ou simplesmente a aceitar e "esquecer". 

    A tristeza não precisa estar acompanhada de choro para sinalizar que é um momento de aprendizagem. E se você não o faz, deixa de lado a prevenção para próximas eventualidades, não no sentido de que estará pronto (calejado) para não sentir, mas para saber como lidar com essa emoção, poder experimentá-la a favor de si mesmo, saber lidar melhor com as perdas. Um dos porquês da tristeza é o fazer perceber que alguém precisa de ajuda, assim como quando alguém explode, indica que devemos nos afastar. Ainda assim, há aqueles que tomam medicação para não sentir essas angústias que são inevitáveis, fazem parte da vida. E muitas vezes de uma vida na qual ser normal (a normose) está virando uma obsessão doentia, desumana e por isso mesmo tendo o efeito oposto do que se pretende. Uma hora, você não aquenta e o resultado você bem conhece, não é? Embora seja um dos aspectos da depressão, a tristeza em si não é doença.

    Outro ponto. Nunca estar triste não significa sempre estar alegre. Pelo contrário, esse auto grau de exigência pode adoecer. 

    Mas de onde vem essa exigência? Esse tipo de comportamento pode ser originado de fatores como  baixa autoestima ou perfeccionismo, e aí você me pergunta, como se identifica e supera isso?

    Vamos lá. Essa pessoa poderia dizer que se ficar triste veriam como ela é frágil. Aí o psicólogo perguntaria "E qual seria a pior parte disso?" Pode ser que ela diga "Vão me ridicularizar". O psicólogo continuaria "E qual seria a pior parte disso?" Ela diria "Nem consigo imaginar. Mais uma vez se questionaria à pessoa "Se te ridicularizassem, isso significaria alguma coisa sobre você?" Ela concluiria que é frágil, não tão forte quanto aos outros. O psicólogo então perguntaria "E o que significaria se você não fosse não tão forte quanto eles?" Talvez ela insistisse que se sente péssima só de pensar em ser frágil, evidenciando então sua crença central de desamparo.

  Como superar tal situação? Modificando seu esquema de que se ficar triste, vão te achar uma pessoa frágil, pensar que você é inferior por ficar triste. Vão rir de você se não se mantiver forte. Trabalhando também a possível suposição de que você se sinta superior por não ficar triste. Uma vez que o problema é que tais comportamentos acabam mantendo sua crença, deixando você cada vez mais próximo da infelicidade e de uma vida pouco saudável na realidade. 

    Aqui estão alguns possíveis questionamentos que ajudariam nessa situação.

PSICÓLOGO: Quais são as vantagens de acreditar que se você não estiver sempre bem, você vai ser inferior?

PACIENTE: Bem, isso pode me fazer ter elogios, pois sou uma pessoa forte, sempre para cima.

PSICÓLOGO: Mais conveniente seria não precisar de uma crença tão extrema para ser vista como superior em vez de igual a todos. Mas deixemos isso de lado por enquanto. Alguma outra vantagem?

PACIENTE: No momento não.

PSICÓLOGO: Quais são as desvantagens de acreditar que você será frágil se se der o direito de ficar triste?

PACIENTE: Bem, eu me sinto ansiosa, às vezes irritada por ter que me monitorar o tempo todo para ver se estou mesmo, digamos, firme.

PSICÓLOGO: E isso tira de você um pouco do próprio prazer de viver?

PACIENTE: Sim.

PSICÓLOGO: Então, essa crença na verdade pode não ser o único meio de você lutar para  ser "forte", há outros meios de ser uma pessoa forte sem se desgastar tanto. E essa crença a faz lutar para ser uma pessoa mais forte do que as outras, mas também te irrita, te deixa ansiosa. É isso mesmo?

PACIENTE: Sim.

PSICÓLOGO: É essa a ideia, então, que você gostaria de mudar?

PACIENTE: Certamente.

Trabalhando algumas novas crenças.

Antigas crenças 


1. Se eu não me sentir sempre forte, sou frágil.


2. Se eu pedir ajuda, vai ser um sinal de fraqueza.



3. Se fracassar em ser forte, fracasso como pessoa.

Crenças mais funcionais


  Se eu não me der o direito de ficar triste,      não sou frágil, apenas humana.

 Se eu pedir ajuda quando precisar, estou   demonstrando boas habilidades para     solução de problemas (o que é um sinal de   força).


Se eu ficar triste, isso não reflete o que  sou  por inteiro. (Todo o meu eu inclui  como  eu sou como amiga, filha, irmã, familiar, cidadã e membro da comunidade  e as minhas qualidades de gentileza, sensibilidade com os outros, disponibilidade, etc.). Além disso, fracasso  não é uma condição permanente.


Referências

BECK, Judith S. Terapia Cognitivo-comportamental Teoria e Prática. Ed. Artmed, 2014.

Nota: As informações e sugestões contidas neste artigo têm caráter meramente informativo. Elas não substituem o aconselhamento e acompanhamentos de especialistas.   

Imagem: Disponível em: http://blognovaalexandria.blogspot.com/2015/04/elogio-das-pessoas-tristes_17.html. Acesso em 10 jan 2021.


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